segunda-feira, 4 de agosto de 2014

asa

seus olhos tinham derretido todas as luzes de ipanema
sugado-as pra dentro de nos
incontrolavelmente desesperado, eu
tentei avaliar o prejuízo da Light
mas feito cão
raivoso
seus olhos roubaram meus lampejos
e sintaxes
eu não podia mais pensar
tudo ja estava pronto e eu não precisava mais pensar
nós estavamos sentados comportados
em frente ao quintal do meu avô
e seu assobio esquivo era cançao de ninar
do meu coração aflito
peguei com meu bico de gaivota
a migalha de biscoito que na tua mão descansava
e trouxe de volta a luz
em flor
pra enfeitar teu cabelo espiral suburbano
você não soube o que dizer
e teus olhos famintos devolveram em gentileza
toda a luz de todos os postes
da minha cidade

era novidade
antiga
um cheiro esquecido
era eu, passarinho
e você
asa

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Degelo Automático

a madeira cura e amansa, num toque frio eu descarrego toda a minha eletricidade obscura num livre movimento de dança e amor com você e seu ventre. rodopio entre as incertezas da vida. a morte se mostra aos poucos escondida debaixo de todas as peles de todas as pessoas no mundo. desisto de pensar enquanto os dedos vítreos espalham meus cabelos brancos no rosto, desisto de medir a distancia entre eu e você. eu queria desvendar o teu mistério. escrever teu corpo inteiro de gis. e esperar meu poema tomar vida através dos seus movimentos harmônicos. esperar a escala girar atras do meu pescoço me desafiando a descobrir nosso tom. fechados os olhos, só me resta espremer os ouvidos até as notas serem palavras. até a vida ser morte. até o fim não ser mais o norte. até eu saber se as palavras que eu escrevi em você ainda existem em algum canto escondido, em algum penhasco assassino. retirei o medo da geladeira, junto dos cubinhos de gelo e larguei ele derretendo dentro do primeiro copo de café que eu achei no seu armário cinza; o café passado que meus olhos bebem adoçado com o pó da tua pele; o café que derrete o cubo de medo esquecido. o esquecimento  a refletir no tampo de vidro onde eu quis perceber a cor da luz do teu cabelo. o corpo fragil a quebrar parcelado, a apagar as luzes. eu invento a noite enquanto o silêncio dela me adormece. eu consumo dez vezes mais vagalumes que antes e a geladeira não precisa mais funcionar no máximo pra congelar o medo.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Nuvem

eu trouxe a nuvem
e tua tempestade
invadiu meu sangue

enquanto eu te penteava os sorrisos
o chão sob os pés
serpenteava
fluído

a sorte de domingo
adormeceu em mim
convencido,
vencido
abismado
esfumaçado
vítreo
transparente dos seus olhos

conheço você
e até sei
tua flor preferida
sem perguntas

eu conhecia você
sem
saber seu paradeiro
ou a fissura
que te separava
do meu omoplata

o barulho, o silêncio
a conversa dos
corpos
sintonia de palavras
derretidas
e
quando vi -

meus escudos
e armaduras vãs
desfeitos
sem suor ou esforço

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Amnésia

eu queria saber quem era eu
antes de toda essa parafernália
embaçar meus sentidos
e embotar minha visão

na verdade
eu era sonâmbulo
trancafiado no
sonho maníaco
e aleatório de
colorir teu corpo de giz de cor
e morar no corredor
elétrico e ofegante
à beira da morte

eu era anti depressivo
porque
acreditava no mundo
e no amor de camisa de força
e choques anafiláticos
e térmicos
da sua língua-enguia
na minha boca de
cobre condutor

na verdade
eu era sonâmbulo
inconsciente vomitador
de amores e paixões
pernas bambas e
ansiedades mórbidas
de arrancar unhas
e papéis de parede

na verdade

eu era um nervo
e mil sonhos sem
uma lembrança sequer

até que tu
sem saber
me deste o divino
dom da amnésia

e eu esqueci
de regar minha memória
e deixá-la crescer
outra vez


quinta-feira, 10 de abril de 2014

Cor tênue (ou o peso abrupto das coisas)

teu corpo era tecido
que me derretia
a visão
e aquele azul
era a hipnose do tempo
colorido
em escamas celestiais

a distração
a síntese era
liquidativa sobre fígados, vesículas
adormecido
paladar
entre dentes
entre as curvas rodoviárias
de uma cintura
abrupta
e corrosiva

---


eu nunca vi tanta luz
que saía
não sei de onde
meu corpo
preso na luz
negra e esquizofrênica
e no cotovelo
que prendia
a ponta da toalha de mesa
suja de café

minha pálpebra presa
pelas pontas
do sol
incerto
exposto
e frondoso
no meio da noite
adocicada

a responsabilidade
leve
sustentada em meu auxílio
pelo carvalho
do guindaste
carnívoro-burgues

segunda-feira, 31 de março de 2014

Sobre as respostas (ou a falta delas)

Eu corro através do tempo. Considerando a possibilidade da sua disparidade atrair minha sonolência pelos caminhos e cantos que quiseres. Conduzido a sentir vontades. De olhar pelo tampo de vidro e encontrar perdido o doce que você largou pela metade. A metade que eu não comi. Pra te ver comer. E fazer mil vozes diferentes a cada sorriso que eu der. Eu começando a aprender a falar. Com você. Com teu corpo. Meus pés atravessaram a louça do jardim. Enquanto no sonho o despertador morreu de tédio. Atravessado nas gargantas silenciosas e adormecidas. O frio invade teus pés. A solidão movimenta as minhas cortinas e apaga as luzes. O microondas grita. Um som uníssono de alvorada e redenção. Recolho nossas bugigangas do chão e penso na luz do teu cabelo. Simples. Sem pensar muito. E sem querer pensar muito. Em nada. Em tudo. Nisso e naquilo. Em que horas morreremos? Em que horas se deve assumir a necessidade? Simples. Sem pesar. Inconsequente desligo a geladeira. E estarreço meio mundo por não querer saber as respostas.

segunda-feira, 17 de março de 2014

Filme mudo

a vida
enquanto viva
torna-se veludo
e sentença
volátil
que
enquadra
e encerra
as cenas de um filme mudo



em mim.