quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Destino Injusto
Tudo mudara. E não fora sua culpa, não podia continuar achando que era. Isso o consumia por completo. Com apenas trinta e seis anos, Estácio aparentava mais de cinqüenta. As circunstancias recolheram tudo que possuía de mais valioso num acidente de carro. Agora, completamente desamparado e sozinho, revirava-se todas as noites tentando dormir num dos becos amarelados da cidade. Andava tão mudado e acabado que seria dificil algum de seus poucos e fiéis amigos lhe reconhecesse ao passar pelo trapo de gente em que se transformara. Aquele resquício de fé que ainda possuía lá por dentro é o que o mantinha quando seu estomago já havia passado inúmeras horas sem nenhuma visita. Deitado no meio fio de uma rua pouco movimentada, Estácio conseguiu ouvir um pequeno fragmento de conversa que se desenrolava entre dois transeuntes. Falavam sobre emprego. E, meio confuso e também abalado por todos os choques e sacolejadas que o destino lhe impusera, pensou que talvez ainda houvesse aquela, pequena, mas até tranqüilizadora, chance de viver novamente. Não que estivesse morto, mas aquilo pelo que passava não se classificava como viver, definitivamente. Mas porque tinha de acontecer justo com ele? Que tivera tantos sonhos felizes? Por que o destino, de maneira tão repentina, lhe injuriou com tremenda frieza? No, aparentemente, infinito espaço de tempo que passara suas noites abaixo daquele teto cheio de pontos luminosos, Estácio tornou-se amigo de um dos caixas de um supermercado que ficava ali por perto. Estácio conseguiu convencer Chico a lhe ceder seu banheiro para que pudesse dar um trato na sua imagem há tanto distorcida. Chico como bom homem que era, deu-lhe também alguma peça de roupa, uma valise para que pudesse carrega-las e algum trocado que guardava para casos emergenciais. Com apenas o necessário, Estácio saiu em busca do tão esperançoso e promissor emprego. Mas para que teria aptidão? Sempre trabalhou na contabilidade da loja de seu sogro, o que na verdade nem era bem um emprego de verdade, consistia apenas numa maneira para que seu sogro pudesse lhe sustentar sem ter que fazer isso diretamente, o que seria humilhante em demasia. A única coisa que arranjara era fazer entregas com uma velha bicicleta emprestada, entregava marmitas de um restaurante pouco frequentado para algumas casas. Com alguns meses de salário, decidiu procurar algum canto em que pudesse usar apenas para passar as noites, algo pequeno e que pudesse pagar com o magro salário que recebia. Foi procurando nos jornais que Estácio encontrou o minúsculo quarto que passou a alugar. Sua senhoria era uma mulher com aspecto muito severo, e apesar disso deixava transparecer, por estreitas brechas, um encanto fora do comum. Nos dias utilizados para adaptação, Helena mal se dirigia ao seu inquilino. Acha-o atraente, sim, mas não podia deixar se levar por um homem que pouco conhecia. Sempre à noite Helena dava uma espiada no estreito corredor e via aquela velha e maltratada bicicleta, e só isso já a confortava. Sentia que era bom ter um homem por perto, isso lhe transmitia segurança. Num piscar de olhos Estácio viu-se completamente envolvido por aquela mulher de traços rígidos e belos. Apesar de tamanha atração de ambos os lados, não havia quase contato nenhum entre os dois. Mal se dirigiam as palavras e quando trocavam sons era apenas para tratar de pagamento. Algum tempo depois, a bicicleta que se encontrava encostada na parede do corredor transformou-se numa moto bem reluzente e aquele relacionamento de estranha e distante afinidade transformou-se num verdadeiro romance. Era estranho para Estácio recomeçar, sentia que podia se decepcionar outra vez já que o destino não era muito seu amigo. Ainda dormindo em quartos separados, pois não queriam se precipitar e se envolver demais, Estácio e Helena formavam um belo casal. Estácio era muito instável, algumas vezes Helena ficava dias e até semanas sem ver a cor dos cabelos de seus cabelos. O que a confortava sempre era ir até o basculante e avistar o brilho metálico da motocicleta. Após um mês sem ver Estácio, Helena tentou chamá-lo ou fazer qualquer outra coisa para que aparecesse, mas alguma coisa dentro de si a fez recuar imediatamente. Era seu orgulho. Seu orgulho não permitia que chegasse a tal ponto. Se ele não queria a ver por tanto tempo deveria ter seus próprios motivos. E no dia vinte e três de julho de 2002, bem de manhãzinha, Helena saiu para fazer compras e viu, em cima da prateleira do corredor, o pagamento pelo aluguel do quarto. Isso não era comum, Estácio nem mesmo se deu o trabalho de esperá-la para entregar o dinheiro, ele nunca tivera sido tão frio antes. E naquela noite a agonia tomou conta do corpo de Helena. No momento em que se esgueirou no parapeito da janela para avistar a moto, nada viu. Pegou a chave reserva e viu que não havia mais nenhum pertence no quarto alugado. Nesse dia morto, vazio, cinzento e empoeirado, o injusto destino simplesmente alcançara Helena.
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Um comentário:
Fala aew Tacílio!! Muito foda o texto cara!! Legal mesmo... =)
Continua com essa porra desse blog!! rsrsrsrsrs Zoaaa!! Sejamos menos grosseiros... Continue com o blog =)
Ah, e claro, farei aqui né, um "mershandaizing" PQP, não sei se é assim que se escreve... Mas ve lá também o meu blog... Coloquei um texto, dia 7... Falow!! Fica com Deus!! Abração!!! Se cuida!
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